quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Pedalando vou...


Se Roberto e Erasmo são amantes à moda antiga, eu sou um policial à moda antiga. Ocorre que os militares mais antigos dizem que todo homem que antrava para a PM, antigamente, comprava para si um rádio e uma bicicleta. Hoje, os sonhos de consumo são outros e o que tem feito a cabeça dos recrutas é o vislumbre de comprarem um carro e um notebook. Estou na contramão da tropa.

Onde moro, além de mim, vivem outros três soldados de segunda classe. Dois compraram motos, o outro, um carro novinho. E o Benfica? Mandou vir de Betim um dos meios de transporte mais recomendáveis que há. Que não polui. Que contribui para a saúde de seu usuário. Que é barato. Ambientalmente viável. Que quase não ocupa espaço e que não requer a burocracia do detran para ser habilitado. Estou falando da velha e boa bicicleta, como já supõe o nobre leitor.

Obviamente, a magrela tem seu pontos negativos, como a inviabilidade do seu uso em dias de chuva, por exemplo. Mas é um meio de transporte fabuloso, que dá ao ciclista vigor e mobilidade no trânsito caótico das grandes cidades, em que pese o fato de eu estar morando numa cidade onde há mais cães de rua que carros. 

Seja em Bom Despacho, seja em Hong Kong, a engenhoca de duas rodas tem seu valor e deve ser promovida munda afora, como vem ocorrendo em lugares mais avançados, digamos assim. Por aqui, ainda há quem me ridicularize e me insite a contrair um fabuloso financiamento bancário que me possibilitará sair por aí queimando gasolina, dando rolezinho. Há quem me compare aos soldados de outros tempos, aqueles que sonhavam com uma bicicleta. Dizem que não pertenço a este tempo. Prefiro entender como elogio, assim não me estresso e sigo pedalando.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A república se calou...


Nessa minha nova vida morando em república, diversas vezes quis que meus colegas de casa desaparecessem, que eu pudesse ficar só com meus botões, que eu pudesse pensar na vida. Hoje minha vontade se concretizou e me fez lembrar o 'slogan' de um filme de terror da minha infância. Do filme, não me lembro, mas o slogan era "cuidado com o quê você deseja".

Desde que me mudei para a nova cidade, tenho tido uma rotina conturbada. Muito estudo, muito trabalho e muita gente sempre ao redor. Normalmente, nos fins de semana em que folguei, voltei à minha cidade, neste, porém, fiquei em casa e meus companheiros de república se mandaram para Beagá. A casa, que sempre achei que deveria ser maior, ficou enorme de uma hora para a outra. O tempo, que sempre passou muito rápido, se arrasta lentamente. Acho que vou endoidecer.

Convidei um amigo para irmos a um bar. Seria ótimo sairmos, vermos gente, principalmente as beldades bondespachenses, com sorte, eu acabaria me desencalhando, mas meu amigo vai trabalhar e eu não me animo a me sentar sozinho num bar. Seria o fundo do poço. Letra de Reginaldo Rossi.

Nesse caso, melhor mesmo é ficar em casa. Assistir a um bom filme, documentário, programa de tevê... minha república tem sky!! Ohh, não... o decodificador está com defeito. Venho para a internet, vício e salvação dos nerds, solteirões, solitários e esquisitos de todo gênero. O relógio continua teimando em parar. O jeito é ir para a cama mais cedo e que venha logo Morfeu.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Saudades...


Ah, a saudade...! Poetas atormentados por ela nos legaram grandes versos. Amantes cometeram loucuras em seu nome. Almas atormentadas deram cabo à própria vida. Corações definharam. Há quem diga que saudade é uma palavra que só existe na língua potuguesa, há quem diga que não. Debates linguísticos à parte, o certo é que o sentimento da ausência fere corações e mentes de todas as raças, idiomas, lugares e épocas. Comigo não é diferente, também sou humano. Também sinto saudades, assim mesmo, no plural. Muitas.

Às vezes, me aperta o peito a falta de coisas que ainda não vivi e de lugares que não conheci. Uma saudade ao avesso, do futuro, ou do infuturo, quem sabe? De coisas que me serão negadas em minha passagem pela esfera azul. Uma saudade estranha, mas não menos cruel.

Outra saudade que sinto é a do presente. Saudade paradoxal. Reconhecimento da plenitude de certos momentos. Acho que são os momentos eternos enquanto duram, como o amor que narrou Vinícius. Hoje, porém, me abateu a saudade clássica, a saudade de alguém. Saudade nobre. Saudade de mãe. 
 
Nesse tempo em que estou longe de casa, experimentei a crueldade do mundo, a indiferença, a solidão, o medo. Deu vontade de voltar a ser menino. De chamar por minha mãe. Hoje acordei querendo colo, mas tive de me fazer duro, encarar meus algozes e suportar mais um dia. Ao final, na volta para casa, vontade de comer a janta que a mãe faz, ouvir uns conselhos e cochilar ouvindo sua voz. Liguei. A Bahia é longe  e as operadoras de telefonia inoperantes.

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Ouço um samba. Vontade de gritar. Desabafar. Ir-me embora. Escrevo. O samba continua... a saudade também.


Mas este mundo é feito de maldade e ilusão
Ah, se eu escutasse hoje eu não sofria
Ah, esta saudade dentro do meu peito
Ah, se ter saudade é ter algum defeito
Eu pelo menos mereço o direito
De ter alguém com quem eu possa me confessar
Ponha-se no meu lugar
E veja como sofre um homem infeliz
Que teve que desabafar
Dizendo a todo mundo o que ninguém diz
Veja que situa...ção
E veja como sofre um pobre coração
Pobre de quem acredita
Na glória e no dinheiro para ser feliz.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Síndrome da raposa.

Minha última postagem - um trecho do livro "O Pequeno Príncipe" - é uma das mais belas passagens que, na minha opinião, há na literatura. Aqui quero comentar o prazer da raposa às quintas-feiras.

Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias!

Hoje experimentei sensação idêntica. Às quartas-feiras, no quartel de Bom Despacho, da Polícia Militar de Minas Gerais, todo pessoal da administração e alunos da Companhia de Ensino e Treinamento, onde estudo, são dispensados à hora do almoço. Têm a tarde livre para cuidarem de assuntos particulares, irem ao banco e afins. Tudo isso ocorre em tese, visto que quase sempre os alunos da Companhia são empenhados em serviços internos de limpeza e policiamento da vila militar.

Desta vez, porém, foi diferente. Deram-nos uma tarde inteirinha de liberdade e eu pude perceber porque tantos lutaram e morreram por ela. A liberdade, quanto encontrada, faz das coisas mais banais momentos únicos de êxtase e transe. Assim aconteceu comigo.

Saí do quartel às 13:00 horas, sob o escaldante Sol Bondespachense. Em casa, comi sofregamente, tomei um banho frio, revigorante, e fui às ruas. Fiz a visita ao dentista, que a tempos posterguei. Conversei com conhecidos que encontrei. Visitei o comércio... Quis intoxicar-me com todas as delícias que vi pela frente. Comprei chocolate. Comi pastel de queijo e bebi coca-cola. Tomei sorvete. Empanturrei-me!

Na volta para casa fui tomado pela melancolia dos poetas. Pensei muito na morte da bezerra. Senti-me como a raposa Saint-Exupery. Senti falta dos ritos, daquilo que faz um dia diferente dos outros. Quisera eu que todas as quartas-feiras fossem como a de hoje: bateção de pernas durante a tarde e navegação na internet para arrematando o dia.

A Raposa e o Pequeno Príncipe.


   
Fragmento de “O Pequeno Príncipe”,
de Saint Exupery





(...)

E foi então que apareceu a raposa:

- Bom dia, disse a raposa.
- Bom dia, respondeu polidamente o principezinho, que se voltou mas não viu nada.
- Eu estou aqui, disse a voz, debaixo da macieira.
- Quem és tu? - perguntou o principezinho. Tu és bem bonita...
- Sou uma raposa, disse a raposa.
- Vem brincar comigo, propôs o principezinho. Estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa. Não me cativaram ainda.
- Ah! desculpa, disse o principezinho.

Após uma reflexão, acrescentou:

- Que quer dizer “cativar”?
- Tu não és daqui, disse a raposa. Que procuras?
- Procuro os homens, disse o principezinho. Que quer dizer “cativar”?
- Os homens, disse a raposa, têm fuzis e caçam. É bem incômodo! Criam galinhas também. É a única coisa interessante que eles fazem. Tu procuras galinhas?
- Não, disse o principezinho. Eu procuro amigos. Que quer dizer “cativar”?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa “criar laços...”
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
- Começo a compreender, disse o principezinho. Existe uma flor... eu creio que ela me cativou...
- É possível, disse a raposa. Vê-se tanta coisa na Terra...
- Oh! não foi na Terra, disse o principezinho.

A raposa pareceu intrigada:

- Num outro planeta?
- Sim.
- Há caçadores nesse planeta?
- Não.
- Que bom! E galinhas?
- Também não.
- Nada é perfeito, suspirou a raposa.

Mas a raposa voltou à sua idéia.

- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa nenhuma. E isso é triste! Mas tu tens cabelo cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...

A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:

- Por favor... cativa-me! disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa nenhuma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto...

No dia seguinte o principezinho voltou.

- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde às três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estaria inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos.
- Que é um rito? perguntou o principezinho.
- É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha. Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria férias!

Assim o principezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:

- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não te queria fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada.
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo.

domingo, 22 de agosto de 2010

E a criatividade, cadê?


Houve um tempo em que minha mente fervia e as palavras eram constantes companhias. Um tempo em que eu pensava, e falava, e escrevia, e lia, e escrevia, e lia. Nesse tempo eu era livre. Não possuia as ambições homicidas. Eu não queria dinheiro, segurança, tampouco futuro. O presente me bastava. Eu me bastava.

De minha turma eu era o amigo criativo e falante, sonhador e doido. Eu queria mudar o mundo. Rir do mundo, não levá-lo à sério. Eu conversava com Raul Seixas, discordava dos santos, ria dos adultos e não me sentia roubado quando me frustrava. Um dia, porém, acordei de acordo, concordando com o sistema. Fui buscar uma profissão, um emprego, dinheiro e uma namorada. Deixei os sonhos e passei às metas, planos e estratégias. Me senti o maior perdedor quando algo deu errado.

Acusei algumas pessoas e condenei outras. Fiz amizades por conveniência. Medi o valor dos outros e desprezei os menos cotados. Busquei reconhecimento. Parei de perder tempo escrevendo ou lendo livros. Gastei tempo com e-mail's, planílhas, gráficos, trabalhos. Nas horas vagas me consumi na internet para ter assunto. Ver os videos que todos viam, abrir uma conta no site de relacionamento da moda e seguir Ashton Kutcher no Twitter.

Hoje tenho diploma e sou concursado do Estado. Se eu não pisar na bola, me aposento daqui a trinta anos. Terei carro e casa própria, filhos e esposa. Minha mãe ou minha avó, talvez diriam amém para isso. Posso ouvi-las dizer: "meu filho, que Deus o abençôe e que tudo isso aconteça, e que Ele dê a você muitos anos de vida para colher os frutos de seu trabalho". Não desprezo as sabedoria dos que já viveram mais que eu, mas agora, no auge de minha juventude, aos meus vinte e poucos anos, essa ideia não me seduz.

Para mim, tudo isso não passa do velho ouro de tolo que já cantou Raul. Eu tenho uma porção de coisas grandes para conquistar, eu não posso ficar aqui parado. Não posso esperar que trinta anos se passem para eu poder já não fazer o que pede meu coração. Dentro de mim habita a urgência da juventude e a prudência da velhice, a suma: conflito.

Passar trinta anos acatando ordens? Servindo? Proibido de pensar? Ou abraçar o incerto e correr todos os riscos? Sou mineiro, seguirei o caminho da previdência. As montanhas que me cercam são deveras altas para que eu as transponha. As montanhas estão em mim. Comigo. Sou parte delas. Sou do granito da Ibituruna, do ferro de Itabira, do ouro de Vila Rica.

Meu mar de possibilidades, de sonhos, está logo ali, mas ali em Minas se mede em léguas. Eu fico. Me calo. Só fala em mim as vozes antigas. Ecoam cá comigo, agora. "Seu lugar é aqui. Arrume uma mulher boa, compre uma terra, não se envolva com nada de errado e se aposente na Polícia, como fez seu avô. Olhe ali, a Pedra Boneca, ela só tem aqueles desenhos, aquele lodo e aquelas árvores porque nunca saiu dali. Pedra que muito rola não cria lodo": ouço meu tio Hélio dizer.


Bendito Sistema.


Há exatamente uma semana que a uma hora desta eu voltava para casa com a cabeça pesada e meio desiludido com o sistema. Ocorre que domingo passado participei de um processo seletivo do cão. Deram-me para responder uma prova de quarenta questões que abrangiam Geografia, História, Protuguês, Literatura, Matemática, Direito, Informática e Legislação. Como bom guerreiro que sou, encarei firmemente a prova e dei o melhor do meu intelecto, que, ao que parece, está muito aquém do exigido na prova.

Saí da sala de prova mais cansado do que se tivesse corrido uma maratona. Me sentindo com Q.I. de ameba, o ser mais burro da face da Terra. Não bastasse a prova extenuante, ainda tive que suportar aqueles concurseiros insuportáveis que ficam debatendo o exame e nos questionando acerca das questões. Dormi o resto do domingo. Na segunda de manhã vi que sobrevivera e que tudo estava nos eixos.

Passados alguns dias, dois ou três, é liberado o gararito que confirmou minha burrice: acertei vinte, das quarenta questões. Conformei-me com o episódio, não com o sistema de avaliação dos concursos públicos, escolas, faculdades e afins. Sei que não posso oferecer nada melhor ao que se tem hoje, mas sei também que o modo como as pessoas são avaliadas, medidas, pesadas, mensuradas, não é o mais correto.

As provas em geral nos avaliam no tempo e no espaço, tempo e espaço esses muito curtos para se dar um veredicto. Somos seres extremamente complexos. Imaginem se as centenas e centenas de livros que li, de filmes que vi, de aulas a que assisti e de pessoas com as quais conversei - que fazem parte da receita de que sou feito - podem ser avaliadas num domingo em que acordei de uma noite mal dormida, com frio e saudade no peito. Não! Não tinham o Tarcísio em sua plenitude. Não puderam avaliá-lo.

Talvez meu caro leitor possa interpretar meu texto-desabafo como um lamento de perdedor, de concurseiro frustrado. É um direito julgar como queira, uma vez que faço público meu discurso, entretando, é preciso reiterar, o Tarcísio que vos escreve não é o Tarcísio em sua plenitude. Talvez eu nunca o seja em nenhum de meus textos, de minhas falas... O sistema não me o permitiria. Ele é cruel. Desumano. Fazer o quê? Corfememo-nos a ele, pois é quem nos fornece a internet, o maior invento do gênio humano.

Vida longa à rede mundial de computadores!!!

sábado, 14 de agosto de 2010

Espumas ao vento.


Não ser leviano com os sentimentos alheios: talvez seja esse o princípio que eu mais preze nos relacionamentos. Relacionamentos são contratos, tácitos ou formais - vide casamento civil - que as pessoas firmam entre si. Mormente, nesses contratos, não se leva em consideração bens, valores ou objetos (pelo menos é no que eu quero continuar acreditando). O que se partilha nesses contratos são as próprias pessoas. Num relacionamento nos comprometemos a dedicar à outra pessoa nosso tempo, nossas pessoas e até mesmo nossos pensamentos. Mas sempre algo dá errado. O contrato é desfeito e alguém sai machucado.

Pelo meu princípio da não leviandade com os sentimentos alheios, a honestidade e franqueza são fatores inalienáveis e inabdicáveis. Não se pode abrir mão delas. São elas que procuro sempre levar comigo nos meus relacionamentos. O problema é que, de um modo geral, as pessoas preferem ser iludidas, preferem que mintamos para elas.

Mais uma vez tenho um relacionamento desfeito por ser quem eu sou, por falar o que eu penso e por não mentir. Eu poderia ter dito coisas bonitas a ela, inverdades, frases prontas... não o fiz e a perdi. Ela foi leviana com meus sentimentos e com minha honestidade. Dessa vez, porém, saio desse relacionamento sem aquela sensação ruim da perda. Sem frustrações ou insegurança. Com o fim, uma gama enorme de possibilidades se descortinou à minha frente. Fronteiras se alargaram e o mundo me parece maior agora.

O cancioneiro brasileiro, repleto de dores de amor, nos diz que dor de amor quando não passa é porque o amor valeu. Assim sendo, concluo que não foi amor. Talvez ela achasse que fosse. Eu nunca disse. Não fui leviano. Posso dormir em paz e sonhar, talvez com um novo amor.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

A Guerra começou


Entrei para a gloriosa Polícia Militar de Minas Gerais, tal qual fizera meu avô, sessenta anos antes de mim. Os tempos mudaram. Progressos vieram. Como sabiamente metaforizou o vovô: antigamente, soldado era moldado pelo cinzel, hoje são desenhando à pena.

Nos idos de 1950, realmente o trem era feio, como se diz por aqui. Haviam castigos físicos, muita precariedade e despreparo. Salário era raro. Mesmo assim, meu avô cumpriu seus trinta anos de serviço e foi descansar em seu sítio.

O século XXI chegou, com ele, melhorias consideráveis na vida do brasileiro, inclusive na dos policiais, quem diria? Nesse ensejo, decidi ingressar nas fileiras dos descendentes do bravo alferes. Qual não é minha surpresa? No dia em que entrei estourou uma guerra.

A guerra em questão é psicológica e física. Testo os meus limites. Meus oponentes são fortíssimos: a saudade, o medo, a falta de dinheiro, um colega de quarto desorganizado e um calo no pé. Na minha última postagem citei Raul Seixas, volto a fazê-lo: ''pare o mundo que eu quero descer''!!!

Quisera eu escrever mais, entretanto é forçosso que eu me despeça do caro leitor: chamada no batalhão às seis da manhã. Preciso engomar meu fardamento, senão o Senhor Tenente...

Fui!

terça-feira, 25 de maio de 2010

Sete dias...

Quem já assitiu ao filme de terror "O chamado" sabe como bota medo na gente. Basicamente, para quem não viu, se é que alguém não viu, no filme há uma fita de video K7 que, se assistida, leva à morte quem a assistiu. Detalhe, o telefone de quem assiste à fita toca e uma voz macabra anúncia: sete dias... Que é o prazo após o qual a pessoa morrerá.

"Ochamado" é um filme lançado em 2002, época em que eu tinha 15 anos, uma imaginação fértil e comportamento de criança. Quase dez anos se passaram, eu amadureci. Embora há quem diga que eu pareça um adolescente de 15 anos, algumas coisas mudaram. Uma delas é que não tenho mais medo de atender ao telefone depois de assistir a " O chamado".

Hoje meus medos são outros. Recentemente fiz as últimas provas de um concurso de cinco etapas. Aproximadamente um ano de testes e muita espera. Foi angustiante. Quase morri de ansiedade. O fato é que tudo está perto do fim. Daqui a exatos sete dias o resultado final será publicado. Minha ansiedade está a mil e temo ser reprovado após tanto investimento. Sete dias... como devem passar rápidos para alguém que está para morrer... e como passam devagar para quem espera uma resposta...

Sete é um número cabalístico, cheio de superstições e crenças em torno dele. Para os cristãos é o número de Deus. Da perfeição. Para mim é um número que quero ver diminuindo até chegar a zero. Tendo em vista que o tempo não se deixa governar, o jeito é eu me apegar ao sete, não o da semana que falta para o resultado do concurso, mas o sete de Deus. Ter muita fé e acreditar que o melhor vai me aocntecer, não importando o quão ruim seja esse melhor.

Como tenho costumado a repetir por aí: andar com fé eu vou, que a fé não costuma falhar. Gilberto Gil deve que sabia do que estava falando.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Sábado que vem tem (mais)...

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José ?

(Carlos Drummond de Andrade)



A vida adulta é tão sem graça quanto eu supunha. Pudera eu evocar aqui todos os poetas e minha angústia não seria definida.

Oh, que saudades que eu tenho da minha infância querida em que eu ansiava aniversários, Natais, Páscoas, quadrilhas e 'setes-de-setembros'. Hoje já não os anseio, mas insistem em vir. Insistem em lembrar tempos áureos, entes idos, sonhos partidos e amores não vividos. Ontem não foi diferente.

Ontem fiz aniversário pela última vez na semana e não poderia ser de outra maneira, ontem foi sábado, a semana acabou. Mas no próximo sábado haverá espetáculo. Minha irmã vem da Bahia. Mais uma vez comemoraremos. Mais uma vez terei de tirar da gaveta minha máscara de festas, meu melhor sorriso e viver o aniversário. Em vez de aniversário eu poderia ter lançado mão de outro substantivo, comemoração, talvez. Mas há de tudo. Há teatro. Encenação. Farsa. Comemoração não há.

Quando fui criança, meus aniversários eram diferentes para mim. Eu manifestava uma real alegria e, honestamente, era grato à vida. Atualmente, percebo que já não há alegria, tampouco gratidão. Questiono. Revolvo-me. Revolto-me.

Ontem, amigos e parentes compareceram. Cada qual fez bem seu papel e soube se posicionar em cena. As falas estavam perfeitas: "nossa, como o tempo passa, não?"; "rapaz, mas que felicidade em vê-lo"; meus mais sinceros votos de felicidade"; "eu não perderia sua festa por nada neste mundo". As vozes ainda ecoam em meus ouvidos. Como estou cercado por pessoas amáveis!

A noite, porém, acabou. Voltei a visitar as masmorras da alma. Tive medo. Quis encontrar o menino que gostava de aniversários. Só encontrei um espelho. Talvez o menino esteja preso, lá dentro, em algum lugar do espelho. Nos olhos que vi, talvez. Quis quebrar o rosto que vi no espelho. Quis libertar o menino. Mas o espelho não se partiu. Quis Gritar. Quis gemer. Quis tocar a valsa vienense... e se eu morresse? _indaguei. Mas você não morre, você é duro, José ! _respondeu-me o poeta. Sábado que vem tem mais.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Novos tempos, velhas cismas


Não sei se é um sexto sentido, mas às vezes tenho a estranha (e desagradável) sensação de que estão me fazendo de bobo. Isso me corrói por dentro, porque trata-se apenas de uma suspeita, um palpite. Tenho me percebido um cara muito ingênuo. Acredito demais nas pessoas, e isso às vezes me faz quebrar a cara.


Nos relacionamentos, cautela vem a calhar, mas desconfiaça não cabe. Recentemente, navegando na internet, eis que surge uma garota, linda, gente fina e solteira. Para completar, nos demos muito bem. Rolou uma empatia enorme e temos muitas afinidades. A relação foi se aprofundando de tal maneira que é como se eu a conhecesse pessoalmente. Como se ela morasse no outro quarteirão.


Infelizmente, no mundo virtual, os relacionamentos podem ser tão conturbados quanto no mundo concreto. Some-se a isso a cautela, que na internet vira desconfiaça. Desconfiança que desperta diversos sentimentos humanos: ciúme, ansiedade, medo... Sim, estou com medo! Medo da minha ingenuidade e da pessoa que posso encontrar. Quando me refiro à pessoa, que fique bem claro que não estou com medo de encontrar uma velha tarada ou um travesti. Não é isso. Minha correspondente e eu já nos vimos, trocamos fotos e temos provas contundentes da existência um do outro.


O medo que sinto é o medo inerente a todo relacionamento. O medo da mentira. De me envolver. De me desgastar. De sofrer. Decidi correr todos os riscos e quero viver esse relacionamento dos tempos modernos. O difícil é conviver com toda essa incerteza... Quero mais é que o virtual se concretize. Que minha musa cibernética venha para o meu mundo de três dimensões.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Que comecem os jogos!


Na antiguidade, para diminuir a insatisfação popular contra os governantes, o Imperio Romano mantinha a política do panem et circenses. Basicamente, a plebe se reunia em estádios para assistirem homens, os gladiadores, lutarem até a morte. O imperador, de seu camarote, era que decidia quem viveria e quem morreria. Um polegar apontado para cima indicava que a vida desgraçada do gladiador derrotado seria poupada. Um polegar apontado para baixo indicava que o perdedor morreria. Sabiamente, o imperador fazia aquilo por que clamava a plateia. De barriga cheia e entretida, a gentalha voltava para sua vida insípida. Mais ou menos como faz hoje o povão brasileiro diante do futebol.

Mesmo pessoas que não são fanáticas por futebol e que não são tangidas junto com a massa, necessitam de subterfúgios como o "pão e circo" romanos. Eu, no exato momento em que escrevo este texto, necessito de algum paliativo para diminuir minha insatisfação. Tal qual a plebe romana, que necessitava de espetáculos sangrentos para se esquecer de sua vida deplorável, eu, e a espécie humana, em geral, necessitamos diminuir nossos descontentamentos. Necessitamos paliativos vários.

A escolha que fiz por esse substantivo foi pensada. Paliativo vem do verbo paliar, que segundo o Dicionário Aurélio quer dizer, entre outras coisas, disfarçar, dissimular, encobrir; tornar aparentemente menos duro, menos desagradável. Paliar é uma necessidade humana, por sua condição efêmera e de incertezas. Não sabemos de onde viemos, nem para onde vamos (se é que vamos a algum lugar depois deste). Para não pensar em tais questões existenciais, nos cercamos de paliativos. Todo esse paliar, porém, não é capaz de nos blindar de tais questões e, num belo dia, nos pegamos angustiados, tristes, cabisbaixos, pensativos, soturnos, macambúzios, sorumbáticos. Passamos a pensar na morte da bezerra.

As épocas que me levam à melancolia são as datas comemorativas. Natal, ano novo e aniversários, principalmente o meu. E qual não é a coincidência? Hoje é vinte de maio, meu aniversário. Eis-me aqui com toda a angústia possível, deconrrente desta data. São três da manhã, o dia mal começou e a insatisfação, parecida com aquela da plebe romana, está instaurada. Necessito da proclamação do augusto césar: que comecem os jogos! Após esta ordem o povão ganhava pão (a rima nem era intencional, mas deixo-a), pessoas, literalmente, se digladiavam, e os problemas pareciam se acabar para a plebe.

Em aniversários, a raça humana se cercou de paliativos muito inteligentes. As pessoas se telefonam como se realmente se interessassem umas pelas outras. Fazem festas, que é uma boa desculpa para comerem todo tipo de comida indigesta, calórica e cancerígena. Compram presentes como se realmente quisessem dar algo ao aniversariante. Interresante notar que somos livres para nos presentearmos o ano inteiro, mas só o fazemos em datas específicas. Depois da internet então, aí que a hipocrisia, digo, o uso de paliativos, descambou de vez. Hoje, basta um simples control+C/control+V e o teatro está encenado.

Há pessoas que, verdadeiramente, gostam de aniversários e dos paliativos que deles decorrem. Eu também já gostei, um dia, lá atrás, na infância. Mas o tempo passou, a ingenuidade se foi e a angústia aumentou. Preciso me dar agora aos paliativos do mundo adulto, pois sei que há.


Em mais um golpe de sabedoria da espécie humana, inventou-se o trabalho e as cidades. O primeiro nos consome, no mínimo oito horas por dia. As segundas nos oferecem carnificinas, acidentes de trânsito, engarrafamentos, violência e um sem número de questionáveis opções de lazer que nos impedem de pensar e, consequentemente, nos angustiar. Talvez um bom presente que posso me dar de aniversário seja um passeio de ônibus por Belo Horizonte, às seis da tarde de amanhã, uma quinta-feira feroz. Pensando bem, melhor é eu não ir. Não seria justo os pobres diabos, que lotarão os coletivos amanhã, terem de disputar comigo os centímetros quadrados mais concorridos da Cidade Jardim. Há quem diga que o metro quadrado mais caro de Beagá está na Savassi ou no alto da Afonso Pena. Eu digo que não. O metro quadrado mais caro de Minas Gerais está dentro dos ônibus que fazem o transporte público, por ele se paga todos os dias. Tem oferta pequena e procura altíssima.

Descartado o passeio pela capital mineira na hora do rush, e considerada minha situação de desemprego, me resta acorrer ao último e mais sublime subterfúgio de que dispõe o homem: o amor. Como é sabido por todos, o amor nos blinda contra qualquer situação adversa, ou como se diz aqui em Minas, com ele, não tem tempo ruim. Está decidido o que quero de aniversário, o melhor dos paliativos. Como escreveu Cazuza, o poeta exagerado:"eu quero a sorte de um amor tranqüilo, com sabor de fruta mordida". E que comecem os jogos!

terça-feira, 18 de maio de 2010

Ainda há salvação.

Segunda-feira é um bom dia para se comprar verduras, frutas e legumes. Assim crê minha mãe, do alto de sua experiência de mulher vivida e atenta. Segunda-feira também é o dia em que as crianças voltam à escola, após um sábado e domingo de muito ócio e energia acumulada. Vivo em uma cidade relativamente grande. Betim é a segunda economia de Minas Gerais e a ela acorreu uma horda de miseráveis, caipiras, nordestinos e pobres de toda maneira. Aqui há emprego.


Com uma arregadação invejável, maior que de alguns estados do norte, a administração municipal se preocupa em atrair mais empresas para gerar mais arrecadação, sem saber o que fazer com as pessoas que vêm atrás dos empregos. A cidade cresceu desordenadamente, o transporte é caótico e não há opções de lazer para a população. O que se tem por aqui mais perto de ser chamado de lazer é uma lagoa que abastece a cidade e aonde algumas pessoas vão morrer afogadas no verão ou são desovadas por traficantes. Há também uma galeria de lojas a qual ousam chamar de shopping e uma avenida por onde as pessoas caminham ou praticam o cooper. O problema da avenida-point é que passa por uma obra que nunca acaba, obra que deixa as pista de caminhadas toda irregular e esburacada, obra que faz um simples exercício físico paracer um passeio pelo deserto em meio a uma tempestade de areia e pó. Enfim, Betim é ótima.


Agora que meu leitor tem noção de como é a maravilhosa cidade em que vivo, prossigo com meu relato. Era segunda-feira e fui com minha mãe ao sacolão. O dia estava acabando quando voltávamos para a casa. As crianças também voltavam para casa, após uma tarde desgastante de aulas (desgastante para os professore, obviamente). Vínhamos, minha mãe e eu, pela Avenida Porto Alegre, (uma das muitas avenidas de Betim que possui um curso d'água canalizado no meio de suas duas largas pistas) quando avistamos uma aglomeração de crianças numa passarela de pedestres que há sobre o córrego do meio da avenida. Gritavam, apontavam para dentro do canal, debatiam, gesticulavam. Minha curiosidade foi ao grau máximo, haveria ali um corpo? Um criança caira lá dentro? Algum louco decidira se banhar naquela água? Fui ver de que se tratava.


Chegando à passarela pude compreender o sucedido. Ocorre que alguém jogara no canal um saco com um cachorro dentro. Os meninas discutiam como resgatá-lo. Estavam indignados com a barbaridade que fizeram ao cachorro. Supunham que o dono do cão o tinha por morto e o descartara ali. Queriam, porque queriam, entrar no canal e trazer para fora o infeliz canino. Continuei meu caminho, processando o quê vi. Quando já estávamos há uns duzentos metros da cena do crime, ouço gritos de júbilo, salvas... resgataram o cãozinho. Quedei-me emocionado. Refleti muito sobre o que vira.




Aquelas crianças e seu ato heróico fizeram-me lembrar de outras crianças de uma outra Betim que conheci. Quando eu cá cheguei o quadro era outro, os pobres daqui eram ainda mais pobres as avenidas sem asfalto e as crianças mais cruéis. Lembro-me de colegas que cometeram verdadeiras atrocidades contra animais e contra outra crianças. Certa vez encontramos, num lote vago, um ninho de gatos. Uma gatinha vira-latas criara meia dúzia e bichanos adoráveis. Minha vontade instantânea foi de levá-los comigo. Corri para casa para pedir à minha mãe permissão de ficar com eles. Ela não queria, mas disse que poderíamos cuidar da gata e dos filhotes até encontrarmos donos para todos. Quando voltei à rua, ao lote vago, tive ganas de matar meus colegas. Eles haviam jogado gatinho por gatinho contra um muro. Estavam todos mortos.


Talvez essa tenha sido essa a primeira vez em que tive ideia de quão cruéis podem ser as pessoas. Daí para frente, decepções foram se acumulando e hoje não me surpreendo facilmente. Minhas surpresas agora advêm da bondade e compaixão de algumas pessoas. Acostumei-me, de tal maneira, a esperar sempre o pior das pessoas que, quando vejo um ato de clemência, como o de segunda-feira, minhas esperanças se renovam, vejo que ainda há salvação e que ela virá das crianças. Invistamos, pois, nelas!

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Formatura


"É preciso ter ritos. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas." (Saint-Exupéry)

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Formatura: meu rito chegou! Neste dia, diferente dos outros dias, há que se prestar a devida homenagem às pessoas diferentes das outras pessoas. Assim, toda minha gratidão e devoção àquela que, sozinha, enfrentou o mundo para que este momento fosse possível. Mãe, sua luta não foi em vão. Agradeço à minha irmã, que desde sempre incutiu em mim o gosto pela leitura. Ao Joaquim, pela disciplina. À tia Penha e ao Tio Hélio, que mesmo distantes são presentes. À tia Marlene, por seu amor. Aos meus avós, tios e tias, primos e primas; por serem a melhor família que há. Aos meus amigos, por existirem.

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Agradeço ao meu grupo, o "Caldeirão", mais que uma simples 'panelinha'; fizemos das aulas momentos inesquecíveis. À Rogéria, Líbia, Michele, Verônica, Débora e Telma, pelo tempero feminino. À memória da Raimunda, de quem herdo a profissão, pela amizade incondicional que me dispensou em vida. Aos duvidosos e pessimistas de plantão, vocês não sabem a força que me deram. Aos anônimos, que, sem marcarem presença, contribuíram de alguma maneira.

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Por fim, minha gratidão a Deus, pelo milagre da vida. "Para sempre Te louvarei, porque Tu isso fizeste." (Salmos 52, 9a)

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Amizade



Meu amigo e eu, amigos já não somos. Na verdade, é amiga. Mas amigo é genérico. Todo mundo é amigo, ou tem amigo, ou sofre por não tê-los. Sabendo da existência deles, e não os tendo, sofrem. (Talvez esses sem-amigos devessem ter lido Saint-Exupery). Talvez não. Nem todos querem ser poetas ou misses. Eu sou dos quem têm amigos. Hoje tenho menos um. Melhor dizer menos uma.

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Minha amiga não foi genérica, foi única. Mas foi. Se foi. Se foi mesmo estando por perto. Em respeito à amizade que tivemos, a chamo Amiga. Amizade é como filho de pais separados, mesmo com o afastamento dos autores, dos filhos e das amizades, eles, os filhos e as amizades, se concretizaram e não há como nos livrarmos deles. Não posso me livrar de minha amizade sem amiga.

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Minha amiga, ingrata, se foi e me deixou com essa amizade saudosamente insistente. Nas horas mais impróprias ela aparece, como filho que vai passar o fim de semana na casa do pai, justamente na noite de sábado em que o pai pegaria a gostosona do apartamento da frente. Aquele mulherão com a qual passou três meses tentando sair. Mas o filho está lá. Filho é filho: gostosona, não nesse sábado, e provavelmente nunca mais, não essa: mulher gostosa é concorrida.

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Ainda falando de mulher gostosa, amizade também pode ser parecida. Quando se teve uma muito boa é impossível não fazer comparações. Amizade nova, ou pré-amizade, como prefiro chamar, porque amizade sempre é velha, do contrário não é amizade, não possui história, não tem memória, 'causos' bons pra se lembrar, como um belo banho de chuva.

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Banho de chuva: a aventura romântico-poética mais clichê possível. No entanto, banho de chuva dá boas lembranças, tão clichês como o banho: pessoas comentando, dizendo que os banhistas ficaram doidos, resfriado, casa 'sujada' e molhada.

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Pré-amizades não têm isso, e quando principiam a ter pode ser a coisa mais maçante, e de tão clichê parecer clichê. Os clichês do mundo só são clichês para a gente quando a gente já os experimentou e os explorou de maneira tal a não querermos repeti-los de maneira alguma, ou daquela mesma maneira sempre.

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Banho de chuva não é pra ser tomado com qualquer pessoa. Amizade também não pode ser construída com qualquer pessoa. Esse papo de um milhão de amigos é promiscuidade. Amizade é intimidade. Intimidade sem mácula, sem sexo. Amizade afasta qualquer desvirtuosismo. Beira o sagrado. Uma amizade bem construída é culto mútuo. Bons amigos se adoram. São determinantes nos amores. Se seu amor não passa pelo crivo do amigo, é amor que não vale. Aliás, vale, quando de seu fim, para o amigo dizer: eu tinha razão. Amigos sempre têm razão. Amigos nunca se vangloriam de ter razão, mas, se não lhes damos razão, o culto não sai perfeito.

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Amizade também tem briga, mas elas nunca são suficientes para acabar com uma amizade. Amizade quando acaba, acaba sozinha. Briga só fortalece as amizades. Amizade sem briga, morre. Acaba. Definha. Minha amiga e eu nunca brigamos... Espere aí!! Minha amiga e eu éramos mesmo amigos? Não sei... sei que a falta de minha amiga ainda me faz companhia.

''O Rei Leão'', a mãe leoa




Dizer que mãe se sacrifica pelos filhos não é nenhuma novidade. Mãe pobre então, nem se fala. Minha mãe sempre foi assim, punha minha irmã e eu como prioridades sempre. Sacrificou-se muito, a coitada. Graças a Deus, seu sacrifício valeu a pena e o tempo das vacas magras passou, não sem deixar preciosas lições e muitas lembranças.
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Basta conversar com a Dona Jandira para notar o grande valor que ela dá à educação e à cultura. Minha mãe sempre acreditou que a arte nos eleva e nos torna pessoas melhores, além de proporcionar entretenimento e lazer. Mas arte e cultura para pobre é um luxo no Brasil. Uma auxiliar de enfermagem, vinda do interior, com uma criança na frente e outra atrás, não podia se dar ao luxo de frequentar teatros, ir a shows, exposições... O que era possível, de vez em quando, eram passeios aos domingos (quando ela não estava trabalhando) no Parque Municipal de Belo Horizonte. Como eram bons aqueles passeios... Se eu pudesse voltar no tempo, não os trocaria por nenhuma Disneylândia com todo dólar do mundo. Éramos felizes e não sabíamos (antes que meu leitor se debulhe em lágrimas, é preciso frisar que sou feliz até hoje, ok?).
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Lembro-me de minha mãe nos levando a peças encenadas na rua e a oficinas promovidas pela prefeitura. Lembro-me dela lendo para nós e nos contando estórias que ouviu em outros tempos. Ela cercou-nos de conhecimento e sonhos. Pela semente lançada por ela é que me embrenhei no mundo das letras. Por esforço dela é que minha irmã e eu vencemos a barreira do ensino médio e chegamos à graduação: realidade tão distante na minha primeira infância em Itabirinha.
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Num dos esforços de minha mãe para que fôssemos atores no mundo, não espectadores, lembro-me do lançamento do filme "O Rei Leão", em 1994. O filme foi um fenômeno, segundo a Wikipedia, "tornou-se o maior sucesso da Disney, com 312 milhões de dólares somente nos Estados Unidos e US$783.841.776 ao redor do mundo. Foi a animação de maior bilheteria, até "Procurando Nemo", em 2003. No Brasil, fez mais de 500 mil pagantes na estréia e 4,2 milhões no total. O VHS vendeu 4,5 milhões de cópias no dia da chegada em 1995, e o DVD, em 2003 chegou a 2 milhões na estréia." Foi a sensação daquele ano. Os cinemas foram lotados por crianças e mais crianças, inclusive minha irmã e eu, certo? Errado! Em Betim não havia cinema naquela época e, onde havia, os ingressos eram absurdamente caros para nossas condições de então.
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Mas, se "O Rei Leão" marcaria a infância de toda uma geração, Dona Jandira não se permitiria deixar seus dois pimpolhos sem participarem daquele ''momento histórico''. Seus filhos teriam que ver "O Rei Leão"! Assim que foi lançado o VHS, minha mãe descobriu uma conhecida sua que tinha em casa um dos objetos de maior desejo dos anos 1990: o videocassete. Conversou com sua conhecida, alugou a fita e marcou um dia para irmos até lá assistir ao badalado filme. Lembro-me que a casa em que vimos o filme ficava em frente ao trabalho de minha mãe. Fomos para lá depois do almoço, início da tarde. Minha mãe deu uma fugidinha do trabalho para nos dar um beijo e ver se estávamos gostando do filme.

As coisas mudaram. Melhoramos de vida. Passado algum tempo compramos videocassete, televisor colorido com controle remoto (a primeira tv que tivemos era vermelhinha por fora e de tela preto e branco, às vezes, para ligar, tínhamos que dar um soco nela), aparelho de som, móveis novos, a casa própria, carro, estudamos, outra casa (maior e num bairro melhor)... Hoje vamos ao teatro sempre que podemos, ao cinema, regularmente, a shows... Compramos livros com frequência, temos internet banda larga e assinaturas de revistas. Tudo melhorou substancialmente. Novas perspectivas se abriram para nós. Sonhamos mais alto agora. De vez em quando, porém, em vez de sonhar, é melhor recordar. Recordar a luta de minha mãe para nos dar dignidade, mesmo quando o mundo insistia em nos negá-la. Hoje sei que, mais que "O Rei Leão", eu tive uma mãe leoa. Guerreira, que não abandona a cria. Que vai à caça. Que luta.
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Mãe, amo a senhora.









Inezita Barroso








Inezita Barroso, nome artistico de Ignez Magdalena Aranha de Lima (São Paulo, 4 de março de 1925), é uma cantora, atriz, instrumentista, folclorista, professora, doutora Honoris Causa em folclore e arte digital pela Universidade de Lisboa e apresentadora de rádio e televisão brasileira, atuando também em shows, discos, cinema, teatro e produzindo espetáculos musicais de renome nacional e internacional.
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Nascida numa família aristocrática e apaixonada pela cultura e, principalmente, pela música brasileira, Inezita começou a cantar e tocar violão e viola desde pequena, com sete anos. Estudiosa, matriculou-se no conservatório e aprendeu piano. Formou-se em biblioteconomia pela USP, antes de se tornar cantora profissional, em 1953. (extraído da wikipedia)



"A Marvada Pinga" é um dos maiores sucessos de Inezita Barroso. Eu simplismente adoro essa música. É muito engraçada, ser interpretada com sotaque caipira a torna mais interessante ainda. A seguir, a letra e o video de uma Interpretação que Inezita fez lá nos anos 1980.

Com a marvada pinga
É que eu me atrapaio
Eu entro na venda e já dou meu taio
Pego no copo e dali nun saio
Ali memo eu bebo
Ali memo eu caio
Só pra carregar é que eu dô trabaio
Oi lá
Venho da cidade e já venho cantando
Trago um garrafão que venho chupando
Venho pros caminho, venho trupicando, xifrando os barranco, venho cambetiando
E no lugar que eu caio já fico roncando
Oi lá
O marido me disse, ele me falo: "largue de bebê, peço por favô"
Prosa de homem nunca dei valô
Bebo com o sor quente pra esfriar o calô
E bebo de noite é prá fazê suadô
Oi lá
Cada vez que eu caio, caio deferente
Meaço pá trás e caio pá frente, caio devagar, caio de repente, vô de corrupio, vô deretamente
Mas sendo de pinga, eu caio contente
Oi lá
Pego o garrafão e já balanceio que é pá mor de vê se tá mesmo cheio
Não bebo de vez porque acho feio
No primeiro gorpe chego inté no meio
No segundo trago é que eu desvazeio
Oi lá
Eu bebo da pinga porque gosto dela
Eu bebo da branca, bebo da amarela
Bebo nos copo, bebo na tijela
E bebo temperada com cravo e canela
Seja quarqué tempo, vai pinga na guela
Oi lá
Ê marvada pinga!
Eu fui numa festa no Rio Tietê
Eu lá fui chegando no amanhecê
Já me dero pinga pra mim bebê
Já me dero pinga pra mim bebê e tava sem fervê
Eu bebi demais e fiquei mamada
Eu cai no chão e fiquei deitada
Ai eu fui prá casa de braço dado
Ai de braço dado, ai com dois sordado
Ai muito obrigado!


Cascatinha e Inhana

Insônia é Freud... 3:52 da matina e eu aqui postando conteúdo que provavelmente não será lido. Se não será lido, que seja minha válvula de escape. Falei, anteriormente de Dalva de Oliveira e postei um video para ilustrar. Agora que aprendi a postar videos nesta bagaça, sou o terror blogueiro...
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O "terror blogueiro" hoje está mais para o "terror caipira". Quem me conhece sabe da minha paixão por tudo que diz respeito à terra, ao Brasil e à cultura do sertão, do interior. Sou apaixonado pelas verdadeiras manifestações culturais. Por aquilo que emana do povo. Da gente simples. A seguir, posto dois videos de uma dupla caipira que vez escola, Cascatinha e Inhana. Antes, apresento uma contextualização (extraída da internet, em itálico) de quem foi tal dupla:
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Quando Francisco dos Santos (20/04/1919 - 14/03/1996) topou com Ana Eufrosina da Silva (28/03/1923 - 11/06/1981) sua vida tomou outro rumo.
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Ele estava em Araras, no interior paulista, se apresentando com o Circo Nova Iorque, e ela foi assistí-lo. Ela tinha 17 anos, estava noiva, mas seu destino estava escrito. "Quando vi aquele mulato tocando violão, me apaixonei" contou ela.
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O violeiro e a moreninha se casaram cinco meses depois, no dia 23 de setembro de 1941. Romance que daria pra virar música, filme e poesia. Cantaram nos picadeiros de centenas de circos por todo o país, gravaram 54 discos de 78 rpm e 30 LPs. Venderam milhares de discos numa época em que vitrola era artigo de luxo. Cantaram o Brasil mulato, o Brasil Caboclo, o Brasil fronteiriço a outros sons e culturas, traduziram a linguagem rítmica e poética de um país que nos anos 50 vivia um acelerado processo de urbanização. (trecho extraído de http://www.lucianoqueiroz.com/cascatinha.htm)

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Neste video é interessante notar que Cascatinha e Inhana dão a explicação do porquê de seus nomes artísticos.





"Índia" é uma guarânia (gênero musical de origem paraguaia, em andamento lento, geralmente em tom menor), que vendeu 300 mil cópias em seu primeiro ano de lançamento e até a segunda metade dos anos 1990 vendeu mais de três milhões de discos. "Índia" mereceu ainda diversas gravações ao longo do tempo como as de Dilermano Reis ao violão, Carlos Lombardi, Trio Cristas e Valdir Calmon e sua orquestra. Em 1973 Gal Costa regravou "Índia", que deu nome a seu LP daquele ano e que obteve grande sucesso. Em 2005 foi tema da personagem Serena, da novela "Alma Gêmea", da Rede Globo, desta vez na voz de Roberto Carlos.




"Meu Primeiro Amor", como pode-se ver, não é só um filme bonitinho estrelado por Macaulay Culkin. É uma belíssima obra de nosso cancioneiro, já gravada por grandes intérpretes, como Caetano Veloso e Maria Bethânia, além dos precursores Cascatinha e Inhana.


Dalva de Oliveira

Há quem demonize a Rede Globo de televisão. Chegam a chamá-la de a sucursal do inferno. Um conhecido meu, nerd, fanático religioso e que não acredita em nada que seja consensual, propaga o ódio a emissora dos Marinho. Eu, pelo contrário, tenho muito que louvar a qualidade de sua produções. Se a Globo peca com seu BBB e com o Domingão do Faustão, se redime por outros aspectos, um dos principais, suas minisseries. Por elas a Rede Globo apresenta o Brasil ao Brasil. Obras literárias são cuidadosamente encenadas (Grande Sertão: Veredas; A Casa Das Sete Mulheres; Os Maias; Memorial De Maria Moura...). Personalidades de nossa história são apresentadas ao grande público (JK; Lampião e Maria Bonita; Chiquinha Gonzaga...). Com o investimento que faz em minisseries, a Rede Globo presta um serviço inestimável a este país.
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Através de uma minisserie recente é que me foi apresentada uma das mais brilhantes cantoras que o Brasil já teve: Dalva de Oliveira. É bem verdade que eu não era completamente alheio ao talento de tal intérprete. Muitas pessoas mais velhas já louvaram seu talento perto de mim. Mas foi a obra feita pela Globo que me instigou a ir além. A ler sobre Dalva de Oliveira. A ouvi-la cantando.


O youtube possui um conteúdo até satisfatório de Dalva de Oliveira, se comparado ao que lá se tem de outros grandes talentos. Uma das raridades que encontrei, gostaria de dividir com você, caro leitor. Trata-se de uma canção carnavalesca chamada "Estrela do mar", que, ao que consta, fez muito sucesso outrora. A seguir a letra, o video e toda a poesia de um época que tem muito há ser resgatado:
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Um pequenino grão de areia,
Que era um pobre sonhador,
Olhando o céu, viu uma estrela
E imaginou coisas de amor.
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Passaram anos, muitos anos.
Ela no céu e ele no mar.
Dizem que nunca o pobrezinho
Pôde com ela encontrar.
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Se houve, ou se não houve,
Alguma coisa entre eles dois,
Ninguém soube até hoje explicar.
O que há de verdade é que depois,
Muito depois, apareceu a estrela do mar.
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Será a bendita paixão?




Mudanças na vida são uma constante para todos, mas há mudanças mais "mudantes" que outras. Às vezes passamos por fases em que uma série de mudanças se somam e, de uma hora para outra, nos damos conta de que nosso mundinho, tal qual o conhecíamos, já não existe. É exatamente por uma fase dessas que estou passando.
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Um momento pelo qual eu muito ansiei foi o da minha formatura na faculdade. Esse momento já bate à porta, e o que faço? Desespero-me. Outra coisa que sempre desejei foi o sucesso profisisonal e pessoal dos meus entes queridos. Numa dessas, minha irmã foi aprovada num concurso público e se mudou para a Bahia. De quebra, levou minha mãe para uma temporada.
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Sucedidos assim só me trazem felicidade (quem me dera eu tivesse uns dez deles por ano...), não estou reclamando, mas me obrigam a fazer um esforço tremendo para me recompor, me adequar à nova realidade. Às vezes penso que tais esforços chegam a mexer com meu sistema imunológico. Com meus sentimentos. Fico vulnerável. Carente.
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Quando se está com a imunidade baixa, doenças oportunistas vêm e nos tomam. Mas e quando estamos com baixa imunidade emocional? Sentimentos oportunistas vêm e nos tomam. O mais perigoso deles: a paixão.
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A paixão, aquela do friozinho na barriga e que nos deixa rindo à toa, é o sentimento que nos pega nos momentos em que ela é mais dispensável. Nos pega quando o objeto de nossa paixão não nos corresponderá. Nos pega quando estamos com a casa em ordem, com um rumo na vida, recuperados de outra paixão. Ela vem e bagunça tudo.
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Pois é, parece que ela chegou para mim. Estou meio que sem conseguir definir meus sentimentos por certa rapariga. É cedo para se afirmar que é paixão, mas duas de suas principais evidências me tomaram recentemente: o friozinho na barriga e a graça sem porquê.
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Quando o assunto é paixão, alguns a defendem veementemente. Outros a tem como coisa do diabo. Eu fico com o meio termo. Reconheço os benefícios advindos dela: ficamos de bem com a vida. Entretanto, não nego os males que acarreta: ficamos ciumentos, irracionais, impulsivos e, o pior de todos, com vocação para dor-de-cotovelo, para o sofrimento.
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A dor-de-cotovelo e eu somos velhos conhecidos. Volta e meia, ei-la me atormentando. Eu dou valor à dor-de-cotovelo e à paixão. Guardo seu devido luto. Ouço músicas bregas. Se preciso, choro. Faz parte do meu show...Um belo dia, acordo e vejo que a paixão passou. É hora de por casa em ordem e dar um rumo na vida. Sigo caminhando, sem saber em qual esquina serei, novamente, acometido pelo mal do coração.
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Por hora, não está definido o sentimento que habita meu peito, todavia, se for paixão, melhor é eu ir me preparando para seus bônus e ônus. Não há como fugir. E para endossar essa certeza, evoco sublimes versos do cancioneiro sertanejo, eternizados por Leandro e Leonardo:
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A gente não teve culpa se a solidão
achou pra nós a saída.
A vida passa, e nesse vai-e-vem,
amores são coisas da vida.

terça-feira, 23 de março de 2010

Qual o sentido de blog? Mais um lugar-comum?


Agora são três e meia da tarde. Não sei por que cargas d'água resolvi acessar este blog. Sempre que o releio, acho tão ridículas as coisas que escrevi, mas continuo o mantendo. Provavelmente para atender a uma necessidade minha de ser igual aos meus contemporâneos que têm blogs, fotologs, orkuts, msn...

Na verdade é isso mesmo que acontece. Fazemos as coisas porque os outros fazem. Um dia desses me vi criando uma nova conta no facebook - eu já criara outra a qual nunca usei. Aconteceu que, por ouvir alguém comentando sobre o facebook, me veio uma necessidade enorme de ter o meu facebook novamente, mesmo sabendo que não o usarei. Com o twitter foi a mesma coisa, logo que surgiu eu quis ter o meu microblog também. Confesso que é interessante o conceito, mas não tive saco para mexer com aquilo, não. Deletei minha conta. Só me resta saber por quanto tempo resistirei sem ter o meu twitter, afinal, o twitter caiu nas graças da mídia e é alardeado por seus usuários. Acabarei seguindo a onda...




Meu caro leitor talvez queira me indicar algum tratamento psicológico, quem sabe psiquiátrico? Deve estar pensando, pobre coitado, maria-vai-com-as-outras... E realmente impressiona a necessidade que os humanos têm de se adequar, se igualar, se comparar e se comportar como seus pares. Mesmo que isso, às vezes, não o agrade. O certo é que, na maiorria dos casos, ser diferente também não é agradável., apenas quando todos são.





O gozado é que está na moda ser diferente, e para ser diferente, todos acabam se igualando. Alguns discursos ''diferentes'':



Ah, eu não assisto a Rede Globo...



Eu não como carne...



Não tenho religião... ou,

Sou ateu...



Eu não assisto ao BBB...



Eu não assito a novela...



Eu, particularmente, ouço frases assim quase todos os dias. E sempre elas saem da boca de pseudo-intelectuais. Pessoas que empostam a voz, como se dessem uma entrevista sobre economia à Marília Gabriela. Sem problemas, cada um tem o direito de dizer coisas como as que escrevi acima, o que me intriga, porém, é que se isso fosse verdade, haja vista a quantidade enorme de pessoas que se manifestam assim, a Globo, a pesar da Record, não seria a líder absoluta de audiência em todos os horários; o Brasil não possuiria os maiores rebanhos bovino, suíno e de aves do mundo; o Brasil não seria o maior país católico do mundo e onde as igrejas, protestantes históricas e evangélicas, mais crescem no mundo; o Big Brother Brasil não estaria na sua décima edição (agora em 2010); e as novelas não seriam um dos assuntos preferidos nas rodas de amigos, nos salões de beleza, em casa e, pasme-se!!, em oficinas mecânicas e obras da construção civil.



Ser diferente e autêntico é super bacana, mas o é porque dessa forma se é igual a todo mundo , entendeu?

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Às vezes pleno, às vezes incompleto




Estou vivendo uma fase da minha vida das melhores que já tive. Os que eu amo estão bem e com saúde. Dinheiro nunca sobra, mas o básico está garantido. Meu coração está preenchido e minha alma serena e em paz. Mas não estou satisfeito, será porquê? Algo me aflige, o que será? Quem sabe a morte, angústia de quem vive? Quem sabe a solidão, fim de quem ama? O certo é que ao homem sempre será negada a plenitude na vida. É fato. É ponto posto.




Difinido que não há plenitude na vida, vou gozando os pequenos prazeres. As horas sem tormento. Tenho visto muitas coisas belas e aprendido muito com isso. Nestas férias ( que infelizmente se encerram em três de fevereiro...) já vi dois arcos-íris, inúmeros pores-do-sol e um céu estrelado que me deixou tonto, na noite escura de Itabirinha. A plenitude, que agora a pouco eu disse ser inalcanssável, talvez ocorra nesses momentos de comtemplação.




É nesses momentos que me dou conta do grandioso, estupendo, inenarrável, maravilhoso e inefável universo do qual sou parte. Nessas horas vejo que as estrelas, que de distâncias imensuráveis se mostram à Terra; que os arcos-íris, aquarela de Deus; e que o Sol, luz melancólica, quase audível; são obras da criação tal qual também o sou. Igualo-me a eles nesses momentos. Plenifico-me.




Talvez meu caro leitor possa dizer a sí mesmo que sou um louco, ou que experimento momentos de megalomania fora do tolerável, ao me julgar tão importante e especial quanto o sol, as estrelas e os arcos-íris. Talvez, como argumento, diga-me que, ao contrário dos astros e dos fenômenos, sou limitado e finito. Que expirarei como todo e qualquer organismo biológico. Entretanto, questiono: o por-do-sol também não expira, para ocorrer no dia seguinte? Os arco-íris não expiram, para ocorrerem na próxima chuva? Também não morreria eu para ocorrer num próximo homem?




Creio que sim. Outros já o disseram. Saint-Exupéry já o disse: aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós. E possivelmente é esta a maneira de occorrermos nos outros, de nos perpetuarmos. De sermos um. De sermos o todo. Talvez quando eu já tiver perecido eu continue em você, que me lê agora.Talvez eu volte a ocorrer num momento seu de comtemplação. Quando você for o todo, será eu. Quando eu sou o todo sou você. Aí, e só aí, somos plenos. No outro é que somos Deus.