segunda-feira, 12 de abril de 2010

Amizade



Meu amigo e eu, amigos já não somos. Na verdade, é amiga. Mas amigo é genérico. Todo mundo é amigo, ou tem amigo, ou sofre por não tê-los. Sabendo da existência deles, e não os tendo, sofrem. (Talvez esses sem-amigos devessem ter lido Saint-Exupery). Talvez não. Nem todos querem ser poetas ou misses. Eu sou dos quem têm amigos. Hoje tenho menos um. Melhor dizer menos uma.

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Minha amiga não foi genérica, foi única. Mas foi. Se foi. Se foi mesmo estando por perto. Em respeito à amizade que tivemos, a chamo Amiga. Amizade é como filho de pais separados, mesmo com o afastamento dos autores, dos filhos e das amizades, eles, os filhos e as amizades, se concretizaram e não há como nos livrarmos deles. Não posso me livrar de minha amizade sem amiga.

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Minha amiga, ingrata, se foi e me deixou com essa amizade saudosamente insistente. Nas horas mais impróprias ela aparece, como filho que vai passar o fim de semana na casa do pai, justamente na noite de sábado em que o pai pegaria a gostosona do apartamento da frente. Aquele mulherão com a qual passou três meses tentando sair. Mas o filho está lá. Filho é filho: gostosona, não nesse sábado, e provavelmente nunca mais, não essa: mulher gostosa é concorrida.

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Ainda falando de mulher gostosa, amizade também pode ser parecida. Quando se teve uma muito boa é impossível não fazer comparações. Amizade nova, ou pré-amizade, como prefiro chamar, porque amizade sempre é velha, do contrário não é amizade, não possui história, não tem memória, 'causos' bons pra se lembrar, como um belo banho de chuva.

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Banho de chuva: a aventura romântico-poética mais clichê possível. No entanto, banho de chuva dá boas lembranças, tão clichês como o banho: pessoas comentando, dizendo que os banhistas ficaram doidos, resfriado, casa 'sujada' e molhada.

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Pré-amizades não têm isso, e quando principiam a ter pode ser a coisa mais maçante, e de tão clichê parecer clichê. Os clichês do mundo só são clichês para a gente quando a gente já os experimentou e os explorou de maneira tal a não querermos repeti-los de maneira alguma, ou daquela mesma maneira sempre.

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Banho de chuva não é pra ser tomado com qualquer pessoa. Amizade também não pode ser construída com qualquer pessoa. Esse papo de um milhão de amigos é promiscuidade. Amizade é intimidade. Intimidade sem mácula, sem sexo. Amizade afasta qualquer desvirtuosismo. Beira o sagrado. Uma amizade bem construída é culto mútuo. Bons amigos se adoram. São determinantes nos amores. Se seu amor não passa pelo crivo do amigo, é amor que não vale. Aliás, vale, quando de seu fim, para o amigo dizer: eu tinha razão. Amigos sempre têm razão. Amigos nunca se vangloriam de ter razão, mas, se não lhes damos razão, o culto não sai perfeito.

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Amizade também tem briga, mas elas nunca são suficientes para acabar com uma amizade. Amizade quando acaba, acaba sozinha. Briga só fortalece as amizades. Amizade sem briga, morre. Acaba. Definha. Minha amiga e eu nunca brigamos... Espere aí!! Minha amiga e eu éramos mesmo amigos? Não sei... sei que a falta de minha amiga ainda me faz companhia.

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