sexta-feira, 24 de junho de 2011

Retratação

Ontem de manhã, protestei contra a barulheira das manifestações culturais de Bom Jesus da Lapa. É fato que me senti incomodado, mas o estranho aqui sou eu. Estou na terra deles, devo respeitá-los. Como na vida nem tudo são flores, nem tudo são espinhos, falarei sobre o lado bom e lúdico do São João.

Na região Sudeste do Brasil, de onde venho, o São João se assemelha pouco com o nordestino. Por lá, comemora-se em igrejas, escolas, em eventos públicos. No interior de Minas Gerais, presenciei festas de São João com uma grandes fogueiras públicas que, próximo da meia-noite, são derrubadas, têm suas brasas espalhadas em um imenso tapete incandescente pelo qual aqueles mais crédulos caminham sobre as brasas e não se quimam.

No sertão baiano, porém, presenciei o São João particular. Por aqui até existem as festas de rua, com apresentações de cantores e grupos musicais, mas em cada casa também se faz uma festa. Em diversas casas de Bom Jesus da Lapa vi fogueiras acesas nas calçadas, ruas inteiras iluminadas, com crianças soltando bombinhas e buscapés. Há pais que vestem os filhos com trajes típicos.

A culinária é um capítulo à parte, merece tratados e mais tratados gastronômicos. É um festival de brasilidade em que nossos ingredientes mais básicos, como milho, coco e mandioca, dão origem a pratos fabulosos. Creio que minha família e eu fomos intimados a entrar pelo menos em umas cinco casas de conhecidos nossos para, pelo menos, provar um ''pratinho'' de quitutes.

Diante de tamanha recepção e de anfitriões tão generosos e amáveis como os baianos, o mínimo que posso fazer é retrar-me, neste texto, pela grosseria de minha parte que foi tecer críticas às manifestações culturais lapenses.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Deixem-me dormir!

Coisa chata essa de ficarem bisbilhotando minha vida. Quando resolvir "ir aos fatos" na última postagem, não imaginei quão desagrável seria ter minha vida exposta. Confesso que o mais irritante foi ouvir palpites. "Ah, você não deveria ter deixado a polícia..." disseram uns. "Ah, você não deveria nem ter entrado..." disseram outros.

O caso é que eu saí e, momentaneamente, vivo em Bom Jesus da Lapa, cidade do sertão baiano, às margens do Rio São Francisco. A Lapa, como se referem à cidade por aqui, é um lugar lindo. Árido, mas lindo. Existe por aqui um enorme potencial turístico. Embora milhares de pessoas acorram para a cidade anualmente - Bom Jesus da Lapa é a capital baiana da fé, segundo maior destino católico do Brasil, atrás somente da cidade de Aparecida - o lugar é mal administrado, sujo e sem infraestrutura sequer para seus moradores. O que dizer para os turístas?

Como uma cidade catolicíssima, na Lapa há devoção para tudo que é santo. Os maiores: Nossa Senhora da Soledade, São Pedro e o Bom Jesus, obviamente. Como uma cidade nordestina, na Lapa há devoção para São João Batista. É amanhã o dia do dito cujo.

Além do catolícismo, na Bahia se concentra muitos seguidores de religiões afro. Antes eu tinha um discurso politicamente correto de respeito à religião alheia. Julgava um preconceito enorme taxar a Bahia de macumbeira. Mas aqui, tomei birra das religiões citadas. Por quê? O leitor deve estar se questionando. Ocorre que aqui, meu vizinho do lado, adora um pemba. A macumba rola solta a noite toda, pelo menos uma vez ao mês. Ninguém, em um raio de quinhentos metros, consegue dormir. Eu creio que ninguém na cidade inteira consegue dormir, porque a cada cem metros há um terreiro de macumba. Os batuques vão reverberando.

Estaria eu com preconceito cristão? Resquício da Inquisição? Não, porque os católicos aqui também não ficam atrás na barulheira. O dia de São João está chegando, é amanhã, como já disse. A euforia pelo dia do santo é tanta que já há alguns dias que se vendem, e se soltam, fogos aqui e acolá. Para completar, a partir das quatro da manhã, um carro de som sai às ruas tocando uma musiquinha irritante: "João Batista é o precursor... blá, blá, blá..."

Não quero aqui, com meu texto, parecer preconceituoso ou desrespeitar de alguma maneira a crença alheia. Quero apenas deixar meu desabafo contra tais manifestações que não respeitam o sono e o descanso dos outros. Quer cultuar? Faça-o baixinho, afinal, nem João Batista, nem os orixás são surdos.