quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Enquanto houver cavalo...

"Observe a formiga, preguiçoso, reflita nos caminhos dela e seja sábio!
Ela não tem nem chefe, nem supervisor, nem governante,e ainda assim armazena as suas provisões no verão e na época da colheita ajunta o seu alimento. Até quando você vai ficar deitado, preguiçoso? Quando se levantará de seu sono? Tirando uma soneca, cochilando um pouco, cruzando um pouco os braços para descansar, a sua pobreza o surpreenderá como um assaltante, e a sua necessidade lhe virá como um homem armado."
(Provérbios 6:6-11)

Quando bate aquele desânimo, aquela vontade de desistir, de jogar tudo para o alto, gosto de refletir neste conselho de Salomão. Grande sábio que foi, o rei Salomão não utilizou de tratados filosóficos complicados para dar suas lições. Com comparações e metáforas como a da formiga, mostrou como "as regras do jogo da vida" são simples. Quem trabalha, quem corre atrás, quem armazena suas provisões no tempo certo, garante os recursos necessários para sobreviver aos tempos difíceis.

Como tudo na vida, é uma questão de escolha. A formiga (se racional fosse) poderia escolher vadiar. No entanto, opta pelo trabalho árduo e pelo esforço desmedido. Nós seres humanos, "racionais" que somos, muitas vezes optamos pelo lazer, evitamos nos esforçar e relegamos o trabalho em segundo plano, mas gostamos e queremos usufruir de seus frutos.

Outra regra simples da vida: Não há colheita sem semeadura. Se estamos usufruindo de frutos que não plantamos, alguém anda semeando por nós. "E isso é ruim?" poderia alguém indagar. Respondo: de forma alguma isso é ruim. É muito confortável termos provisão de frutos em nossa vida sem o trabalho de cultivá-los. Há, porém, um grande risco nisso. O semeador que cultiva os frutos que, por ventura, possamos consumir sem trabalhar, pode um dia parar de semear e nos deixar à míngua.

Quando assumimos o cultivo de nossas próprias lavouras, sabemos quando esperar a colheita e o que fazer com ela. Controlamo-la. O preguiçoso não sabe o que é isso. Habituou-se à inércia e, como um passarinho no ninho, aguarda de boca aberta que alguém lhe leve o alimento.

O dileto leitor talvez estranhe a temática desta postagem e possa estar se indagando: "Terá ele passado tanto tempo sem escrever por estar com preguiça?" A resposta é: não! Ultimamente, deixo de fazer muitas das coisas de que gosto (entre elas escrever) justamente pelo contrário da preguiça: o trabalho em demasia. Este ano a vida me trouxe ótimas oportunidades e eu me lancei a elas. Ocorre que Deus foi tão generoso comigo que as oportunidades foram muitas e, para aproveitá-las, sacrifiquei algumas superfluidades.

Assim vou eu com minha vida de formiga, mas eis que volta e meia surge alguma cigarra vadia me convidando para cantar com ela e querendo levar alguma vantagem do meu esforço. Bobo que às vezes sou, costumo me flagrar fazendo o trabalho de alguém que não se esforça. Nessas horas, lembro de um provérbio, não de Salomão, mas de uma pessoa tão sábia quanto ele: minha mãe. Costuma ela dizer: "enquanto houver cavalo, São Jorge não anda à pé." Que mulher sagaz!

Hoje, foi um desses dias em que fiz papel de cavalo. De burro, aliás. Dispus-me a trabalhar para alguém que simplesmente não liga para nada, pois ainda conta com quem lhe envie doces frutos, os quais saboreará preguiçosamente. Como na vida "nada vem de graça, nem o pão, nem a cachaça", eu é que tenho de dar valor ao meu esforço. O mundo lá fora não dá a mínima para o peso de meu fardo, que, há que se dizer, não é nada leve.

A ficha caiu. São Jorge, arrume outro cavalo!